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Ancoradouro
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Foto: Camila Pierobon. Data: 31/05/2023. Local: Ponte Rio-Niterói. A fotografia oferece uma visão panorâmica da frota de navios-tanque ancorados na Baía de Guanabara. Eles  realizam o transporte de petróleo das Bacias de Santos e Campos até as refinarias. Essas embarcações permanecem nas áreas de fundeio, seus motores roncando ininterruptamente, dia e noite. Completando este cenário industrial, o contorno da Serra dos Órgãos surge ao fundo, delineando uma paisagem que contrasta com a atividade humana em primeiro plano.

Guardiões da Baía de Guanabara - Alexandre

Dentre os maiores problemas enfrentados pelos pescadores artesanais, destacam-se os conflitos com as indústrias petroleiras e refinarias, tanto nacionais quanto internacionais, presentes na região. Essas indústrias controlam uma extensa área no espelho d'água da Baía de Guanabara, que inclui a utilização de dutos subaquáticos e terrestres, bem como navios-tanque que transportam petróleo das Bacias de Santos e Campos para as refinarias, e áreas de fundeio onde os navios ancoram. Essa influência das indústrias é claramente evidenciada no mapa abaixo.

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Fonte: PEA - Redes de Baía. Episódio 1 - A Memória e a História do Tráfego de Embarcações na Baía de Guanabara, YouTube, minuto: 8:11.

Vale ressaltar que este mapa não abrange as áreas de segurança designadas pela Marinha do Brasil, as zonas de proteção dos aeroportos, os territórios de pesca controlados por grupos paramilitares, as áreas assoreadas e as regiões gravemente poluídas, onde a atividade pesqueira não é mais viável. Levando todos esses fatores em conta, aos pescadores artesanais apenas 12% do espelho d'água está disponível para a prática da pesca. Nestas áreas, eles ainda enfrentam a competição com as pescas de arrasto, frequentemente conduzidas por atores armados, que retiram toneladas de peixes e crustáceos da Baía de Guanabara.

Áreas de Fundeio

Vídeo sobre as áreas de Fundeio

As áreas de fundeio são espaços regulamentados pelo Estado destinados ao ancoradouro de embarcações. Geralmente, a profundidade dessas áreas é artificialmente mantida por meio de processos de dragagem. Consequentemente, as áreas de fundeio se destacam como as regiões mais profundas da Baía de Guanabara, especialmente diante do aumento do assoreamento do espelho d'água. 

A profundidade dessas áreas confere temperaturas mais frescas em comparação com as águas em regiões assoreadas ou de baixa profundidade. De acordo com a perspectiva dos pescadores artesanais, peixes e crustáceos de maior porte e valor comercial tendem a permanecer nas áreas de fundeio. No entanto, é importante ressaltar que a pesca artesanal é proibida nessas localidades, sujeitando os barcos dos pescadores à apreensão pelas autoridades competentes se eles pescarem lá.

Apesar dessa proibição, alguns pescadores optam por arriscar-se a pescar nas áreas de fundeio, pois vêem nessa atividade a única maneira de continuar a subsistir da pesca.

Poluição Sonora e Luminosa

Os pescadores artesanais assinalaram outro desafio decorrente do aumento do tráfego de navios-tanque: a poluição sonora e luminosa.

Em relação à poluição sonora, os pescadores argumentam que o grande número de navios-tanque ancorados na Baía de Guanabara mantém seus motores em funcionamento ininterruptamente, vinte e quatro horas por dia. Devido à rápida propagação do som debaixo d'água, os pescadores acreditam que esse fenômeno resulta na diminuição da quantidade de peixes migratórios que entram na Baía de Guanabara. 

 

Este problema se combina com a questão da poluição luminosa, já que a maioria das atividades de pesca artesanal de pequena escala na Baía de Guanabara ocorre durante o período noturno. A iluminação dos navios interfere na pesca de duas maneiras: em primeiro lugar, dificulta a entrada dos peixes migratórios na Baía de Guanabara e, em segundo lugar, torna a pesca mais desafiadora, uma vez que os peixes tendem a se deslocar para áreas mais profundas e escuras da baía.

Assoreamento

Vídeo: Camila Pierobon. Data: 15/06/2023. Local: Colônia Z10, Ilha do Governador. O vídeo foi realizado  por volta das 5h da manhã, durante a maré baixa. Nela, é evidente a vasta extensão de lama na foz do rio Jequiá. Em destaque do lado esquerdo, temos a planta de lubrificantes da Shell. Mais ao fundo, o Pão de Açúcar e o centro do Rio de Janeiro compõem a paisagem. No caíco, observamos um pescador artesanal regressando de uma jornada noturna de pesca, utilizando o remo, visto que ele não pode ligar o motor do seu barco por conta da lama. Infelizmente, aquela noite não foi produtiva, e ele voltou sem peixe.

O assoreamento representa um dos desafios mais críticos para os pescadores artesanais. Uma significativa parcela das áreas permitidas para a atividade pesqueira encontra-se profundamente afetada por este fenômeno. Mesmo que a principal motivação deste estudo não tenha sido investigar as origens do assoreamento da Baía de Guanabara, foi possível destacar, a partir dos relatos dos pescadores, algumas suas de causas:

Descarte Ininterrupto de Resíduos: Há um fluxo contínuo de resíduos sólidos oriundos dos rios que deságuam na baía, intensificando o processo de assoreamento.

 

Desmatamento dos Manguezais: O declínio acelerado dos manguezais, ecossistemas vitais para a saúde costeira, tem sido apontado como uma das causas do assoreamento.

 

Desenvolvimento Urbano e Industrial: A implantação de indústrias, comércios e habitações nas regiões de manguezais e no entorno da Baía de Guanabara, muitas vezes sem autorização legal para suas atividades.

 

Operações de Dragagem: As operações de dragagem realizadas em áreas de fundeio liberam resíduos que, por sua vez, se sedimentam nas margens da baía, agravando o problema.

O assoreamento tem implicações profundas e danosas para a pesca artesanal. De início, é fundamental compreender que os pescadores artesanais planejam suas atividades em harmonia com os ciclos das marés. O assoreamento impacta neste planejamento, visto que é preciso garantir que os pescadores retornem antes que a maré vaze por completo. Caso falhem em seu planejamento, enfrentam o perigo de ver seus barcos presos na lama espessa, com alta concentração de resíduos domésticos e químicos. Nas situações em que os pescadores não conseguem retornar, a única opção é esperar, cerca de 6 horas, pela próxima alta da maré para poderem retomar o caminho de casa. Este cenário não apenas compromete a segurança dos pescadores, mas também impacta diretamente na eficácia e produtividade de suas jornadas de trabalho.

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Foto: Camila Pierobon. Data: 21/07/2023. Local: Colônia Z10, Ilha do Governador. A fotografia mostra o jovem Kauê, filho de pescador artesanal, aguardando a subida da maré para poder retornar para a casa. Ao fundo, vemos a planta de lubrificantes da Shell.

O aquecimento das águas nas zonas assoreadas é uma grave preocupação ambiental e econômica. Nestes locais, a profundidade raramente excede 1 metro centímetros, mesmo durante a maré alta. Essa característica mais rasa favorece o rápido aquecimento das águas. Em resposta a essa alteração térmica, os peixes, buscando condições mais adequadas para sua sobrevivência, migram para áreas com águas mais frias, como as áreas de fundeio para embarcações, como relatamos acima. Em casos mais críticos, esse aquecimento pode resultar em um aumento da mortandade de peixes, já que a elevação da temperatura da água pode diminuir os níveis de oxigênio disponíveis, tornando o ambiente inóspito para a vida aquática. Esse cenário não só afeta a biodiversidade, mas também repercute negativamente na economia local, principalmente para aqueles que dependem da pesca artesanal para seu sustento.

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